desenredo, subst.
masculino -
ação ou efeito de
desenredar (-se);
      * * * * * * DESENREDO * * * * * *      
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desenredamento;
desprender-se da rede;
separar-se do que
está enredado.

A CASA SEM AMO
José Carlos Corrêa Cavalcanti - 14/out/25

Momentos de fracasso e sofrimento podem ser ocasiões propícias para libertação. Libertação de nosso Ser total, enredado no desfile de sensações físicas, percepções sensoriais, emoções dolorosas e pensamentos contraditórios que se revezam em nossa consciência.

Mas esse desfile é importante, pois faz parte do despertar do Espírito: se não houvesse sofrimento, como ele poderia tomar consciência de si mesmo? Na manifestação o Espírito esquece sua origem, ao identificar-se com o corpo físico. E quando o Espírito (manifesto em cada ser humano) julga ter incorporado as marcas emocionais decorrentes da existência como parte integrante de si mesmo, aí ocorre o desenvolvimento de uma identidade falsa — que é o estado largamente predominante.

Não conhecemos nosso Ser total; conhecemos apenas os personagens que nele se manifestam. Cada personagem é um fragmento de nossa experiência, de nossos relacionamentos, nos quais vivenciamos a novela de nossa existência, onde somos o ator principal a desempenhar inúmeros papéis, guiado por emoções recorrentes (que caracterizam nosso sentir) e narrativas mentais (que as reforçam e são por elas reforçadas).

A Neurociência descobriu que, quando que a amígdala detecta situações potencialmente ameaçadoras (amígdala é a parte do cérebro que detecta, INDEPENDENTE de informações verbais, situações consideradas de risco, como a visão de um inseto perigoso ou uma pessoa inamistosa), nossos pensamentos subsequentes serão precedidos de um processamento inconsciente de fundo emocional, o qual influenciará fortemente nossos julgamentos e decisões.

Isso significa que, inúmeras vezes, temos pensamentos originados de alguma emoção atuante desde os bastidores (fora de nossa consciência) e direcionando nosso comportamento. Essa é a base sob a qual funcionam os personagens que representamos na vida, cada um dos quais, embora temporário, se passa por nosso legítimo eu, até ceder seu lugar a outros no carrossel da existência.

Isso mostra que nossa mente é uma casa com muitos servos, mas cujo dono está ausente. Cada servo é uma tendência ou energia emocional processada inconscientemente pelo cérebro ANTES que as narrativas conscientes sejam elaboradas, influenciando decisivamente nossas escolhas e reações — e assumindo o controle por certo tempo, durante o qual age como se fosse o amo absoluto.

Ao se alternarem as condições internas e ambientais, com o surgimento de outros estímulos sensoriais e novos desafios físicos e psicológicos, que faz o novo serviçal que assume o controle? CONTRADIZ, em todo ou em parte, o que o anterior fizera.

Estará ele com a razão? Estará ele sendo o amo verdadeiro, autêntico, sábio e equilibrado, ou será ele, também, apenas fruto das emoções atualmente sendo representadas e das narrativas sobre elas construídas?

Essa alternância de supostos senhores em nossa consciência, guiadas por emoções de dor, incompletude e desejo de satisfação, é tremendamente desgastante para nosso corpo e estado psicológico, sendo a fonte da grande maioria de nossas doenças físicas e mentais.

Cada servo é uma emoção ou tendência que interpreta o mundo COMO ELA PRÓPRIA É, ou seja, de acordo as impressões das quais está impregnada, obrigando-a a ver e sentir APENAS o que está programada para ver e sentir. Isso tem a maior importância, pois o ver/ouvir, emocionalmente interpretado, aponta para algum tipo de desgosto ou ferimento em nosso senso de identidade psicológica, colocando-nos em um estado de tensão.

Mas não se trata de uma agressão real. Não se trata de um leão nos perseguindo na floresta. O perigo é imaginário.

A consciência que percebe o mundo identifica-se com essas interpretações, e se transforma no ente abstrato que pode ser ferido — nosso eu pessoal.

Mas afinal QUEM é este que reage? Será nossa própria consciência?

SIM? NÃO? É a consciência INTUÍDA de ser diferente de si mesma. Para agir no mundo, ela se REVESTE de uma identidade provisória, o ego — que deveria ser um auxiliar ou representante, mas ao julgar ter existência autônoma e independente, converte-se no eu pessoal.

É este que se ofende.

É este que fica ferido.

E reage a partir desse desgosto, aborrecimento ou inquietação, gerando caos interno e externo.

Tudo isso nos prepara para a seguinte pergunta: Conhecemos os personagens e sua alternância, mas e quanto ao Ator em si mesmo, desvestido de qualquer personagem?

Essa pergunta é importante porque enquanto não tivermos esse primeiro sinal de lucidez interna, não se poderá falar em MATURIDADE, porque estaremos, então, no modo personagem. E um personagem IGNORA COMPLETAMENTE o que é isso. Ele não pode saber, porque está a representar um papel, cegamente, sem assumir nenhuma responsabilidade.

Pense em você mesmo, quando tomado por raiva, revolta ou ciúme.
Nesses momentos, você nem ao menos pondera suas palavras ou sua expressão corporal: como poderia ser responsável?

Maturidade é o estado da mente que assume a responsabilidade por seu sofrimento — e esse estado é muito raro, porque "os culpados são sempre os outros".
Enquanto formos dominados por essa ideia, nossas fragilidades emocionais inatas sabotarão nossos relacionamentos e abrirão espaço para inúmeras críticas e acusações... aos outros, como causa de nossos males.

Pensando estar nos protegendo, estamos na verdade eternizando energias primitivas inconscientes de si que se manifestam destrutivamente, permanecendo não reconhecidas. E elas precisam ser reconhecidas. Mais do que isso, têm que ser ACOLHIDAS E GENTILMENTE COMPREENDIDAS. Nós, porém, as detestamos, e por isso somos escravos delas.

Cada alma humana é o repositório das dores, desejos e temores da experiência humana. Mas estamos atados ao desejo de felicidade, que é entendida como o usufruto de sensações agradáveis o tempo todo, o que é claramente impossível. Estamos sempre a nos ferir, e... os outros são os culpados.
Mas mesmo quando nos reconhecemos como culpados de nossas desventuras, ainda é o JULGADOR INTERNO que está dando as cartas, o qual é um aspecto da falsa identidade — e esta é garantia de VAZIO, TRISTEZA E ETERNA PROCURA.

Pense nisso, veja se não contém uma verdade para você num sentido mais profundo, independente de qualquer crença ou opinião.


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